Recebi recentemente a pergunta abaixo e decidi compartilhar a resposta, pois julguei que a dúvida do colega é pertinente e que muitos talvez tivessem a mesma curiosidade sobre como evitar problemas cardíacos nos esportes de longa duração.
Boa Noite Rodrigo!
Sou praticante de triathlon há 2 anos e treino em média de 8h à 11h por semana, com orientaçāo de uma assessoria e com exames cardiológicos anuais.
Lendo alguns artigos de pesquisas recentes à respeito do malefício cardiológico dos esportes aeróbicos de alta intensidade como triathlon, confesso que fiquei um pouco preocupado com essas notícias e estudos de Universidades e médicos pesquisadores Mundialmente Renomados à respeito do assunto, principalmente por serem problemas no coraçāo que sāo gerados a longo prazo (5, 10, 15 anos….de prática de esporte endurace de alta intensidade).Veja alguns artigos:
https://nutricaobrasil.wordpress.com/2013/08/24/exercicios-de-longa-duracao-e-lesao-cardiaca-alta-intensidade-de-treinos-e-morte-subita/
https://web.archive.org/web/20161018165307/http://triathlon.competitor.com/2014/02/insidetri/from-the-heart_93083
Você sendo um triatleta e treinador experiente e atualizado no mundo do triathlon, gostaria de saber sua opiniāo e ponto de vista à respeito do assunto e se você conhece algum artigo que rebate essas pesquisas?
Minha Resposta:
Não sou cardiologista então vou emitir minha opinião pessoal, baseado no pouco que estudei sobre o assunto (sou especialista em fisiologia do exercício) e segundo minha experiência profissional.
Nunca tivemos tanta gente fazendo tanto exercício por tanto tempo. De uns 20 anos pra cá, mais pessoas passaram a fazer exercícios regularmente e participar de provas de endurance de longa duração.
O exercício tem inumeros benefícios, mas o que a ciência tem mostrado pra gente é que o exercício para fazer bem tem um limite, e embora esse limite ainda não esteja exatamente claro (acho que tem um fator individual aí), acho que as provas de longa duração, não fazem tão bem quanto se imagina.
O que se vê é que muitos dos triatletas profissionais da década de 90, hoje tem problemas articulares (tem muita gente com prótese de joelho e prótese de quadril, coisa normal para senhores e senhoras sedentários na casa dos 80 anos e não para uma pessoa supostamente saudável) além de alguns casos de atletas que desenvolveram problemas cardíacos.
Quanto aos problemas cardíacos penso que eles ficam dentro da faixa de normalidade, que para muitas anomalias acomete em torno de 1% da população.
No entanto, esses fatos citados em um dos links compartilhados por você (pequenas cicatrizes no tecido cardíaco, queda na imunidade após provas longas, alteração do funcionamento do coração após provas longas), acontece sim e vários estudos atestam isso.
Fazer um ou outro Ironman ao longo da vida, com a devida preparação, acho que no longo prazo isso não teria grandes implicações na vida das pessoas. Mas fazer um ou mais ironmans todo ano, ano após ano, acho que isso sim pode trazer consequências desastrosas para o organismo. Principalmente com uma preparação deficitária, como tem a maioria dos atletas amadores.
Outra coisa que deve se avaliar, é que tem muito atleta fazendo uso de substâncias proibidas como esteróides anabólicos, EPO, Hormônio de Crescimento (HGH) e corticóides, e o uso indiscriminado dessas substâncias pode sim influenciar o surgimento de problemas cardíacos. No nível profissional, não devemos nos enganar pois penso que muitos dos atletas fazem uso de substâncias proibidas, e infelizmente o número de amadores na mesma situação tem aumentado. Não me surpreeenderia caso tivessemos teste anti-doping nas provas e descobríssemos que grande parte daqueles que se classificam para o Ironman Hawaii pegam vácuo e fazem uso de substâncias proibidas. Repito é claro que tem exceções, conheço e acompanho alguns atletas que são absolutamente limpos, mas que tem gente usando tem. Eu mesmo sou totalmente contra o uso de qualquer substância desse tipo e costumo não treinar pessoas que façam o uso de substâncias proibidas.
Mas quanto às suas dúvidas, penso que:
- É necessário sim fazer acompanhamento médico e cardiológico todo ano (testes cardiacos, hemograma completo…).
- Acho que sua faixa de horas de treinamento é segura (8-11h). Acredito de verdade que até umas 15h de treino semanal PODEM ser saudáveis se o atleta consegue dormir o suficiente e se alimentar de amaneira adequada. Mas acho que o ideal para a saúde seria algo entre 6-8h /semana; e para otimizar os resultados de um atleta que quer disputar provas de 1-2h, fica em torno de 8-12h/sem de treino.
- O treino deve ser acompanhado por um bom profissional, para ajudá-lo a controlar e equilibrar o seu treino. Idealmente o seu treinador deveria monitorar a sua curva de fitness/fadiga do atleta.
- Por questões de saúde, acho legal limitar as prova de triathlon, ciclismo e MTB às provas com menos de 3h (Xterra, triathlon olimpico, sprint triathlons, duathlons, aquathlons…). Meio Ironmans, podem ser saudáveis se o atleta tiver uma preparação adequada (vale a pena ler Os Seus Treinos Condizem com a sua Realidade?), e se as provas não forem feitas muitas vezes por ano. Acho que até 2 provas de Ironman 70.3 e um Ironman por ano pode ser saudável, mais do que isso eu acho que não. De novo, ressalto que essa é a minha opinião pessoal.
- A importância do descanso: Acho que a intensidade é muito mais importante que o volume de treino, e quanto mais velho fico, vejo que maior é a minha necessidade de dias de descanso na minha semana. Atualmente procuro fazer 2 dias de descanso completo por semana, para conseguir me recuperar das minhas demandas de treino, e render como procuro nos dias de treino mais intensos.
- Treinos complementares: com o passar dos anos as atividades complementares passam a ser mais importantes. Atividades como Pilates, Musculação e Yoga são fundamentais para a prevenção de lesões e para garantir a sua longevidade do esporte. Qual a sua atividade ideal? Depende dos seus limitantes, atletas com pouca flexibilidade e problemas de core se beneficiariam muito de aulas de Yoga, atletas com desequilíbrios musculares significativos se beneficiariam muito da musculação e Pilates. Eu mesmo, adoto várias dessas atividades ao longo do ano. No verão costumo pegar firme no Yoga, durante os meses de inverno onde meu volume de treino cai um pouco gosto de me dedicar à musculação para preparar meu organismo para os treinos mais puxados que costumam acontecer no calor.
Bons treinos!
Deixe um comentário
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.